segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Vida Que Ninguém Vê?




Mãos ao alto!
Mostre tua dor com as mãos que colhem lixo
Precisamos vê-la, inextinguível e humilhante,
Do contrário, num suposto arremedo de submissão,
Os tanques de guerra anunciarão o dia dentro da noite
E todas as mães engatilharão cirandas nas orelhas de seus filhos
Atirando-as até a surdez e o esquecimento dos clarões,
Ainda, e mesmo com as mamas assustadas da secura do leite,
Elas aconchegarão seus rebentos sobre os cemitérios dos peitos,
Prontas, a ensinar-lhes os velórios e todas as coisas que doem

Teu chão de versos simples, animado por ladeiras e becos,
Descaminhos do céu jamais reconhecidos pelos deuses,
Não mais cantará Bezerra, Monarco, nem Dona Ivone Lara
A poesia do morro, seus tambores negros, suas vozes renitentes,
Todos serão vitimados bem diante dos pequenos,
Pelo rigoroso inverno que se abaterá nas muitas malocas e almas suspendidas,
Após chuva de metais e intolerâncias.

Deixe-nos ouvir o ranger dos ossos esganiçados sob tua pouca carne,
Quando os testículos forem acossados por nossa força.
Que os joelhos esbodegados sejam dominados pelo rigor dos uniformes,
Que caiam de vergonha e dor
Assim, teus olhos atacados, por medo e ignorância, hão de render-se ao infesto.
Talvez, te salve a pele dos urubus e vermes
Talvez, as mães possam continuar com preces e parcos almoços
Talvez, os batuques até ganhem os jardins da burguesia,
Pois, se tiver no pescoço a dobra e na presença uma quase transparência.

Porém, contra nossa doença, tu, que tens a vida que ninguém vê,  
Terás que nascer de novo.

11 comentários:

Joelma B. disse...

a vida que ninguém vê... às vezes lida... dura lida!

beijo,beijo, Ira imensamente brilhante!!

Tania regina Contreiras disse...

Tu me sacode, explode o que eu camuflo, tira a pele da metáfora...Um ahhhhhhh!!!! ao te ler.

Beijos,

Nilson Barcelli disse...

Parabéns pela excelência deste poema.
São poemas como este que mostram que és uma grande Poeta.
Ira, querida amiga, tem uma boa semana.
Beijo.

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Minha querida

Uma explosão de sentimentos...um caudaloso rio por onde correm todos os gritos.
Não tenho palavras...apenas admiração.

Um beijinho com carinho
Sonhadora

Marco disse...

Um belo poema... Espero que esta nova fase seja tão promissora quanto a anterior... Abraço fraterno, MR.

Unknown disse...

pela vida que ninguém vê soçobram olhos onde a gente que se esconder,


beijo

Sandra Subtil disse...

Emocionante!
Belíssimo poema, Ira! Um grito de vida acordando consciências.
Beijo

Domingos Barroso disse...

mordi meu lábio,
esse poema me fez morder o lábio
...


beijo carinhoso.

Daniel disse...

Como sempre teus escritos alucinando nossa mente de imagens cheia de realidade, gosto de passar por aqui, mesmo que isto demore. Tens um dom único

Dan

Unknown disse...

num "chão de versos simples", tudo o que os olhos não sabem ver. porque a cegueira é o mais demente estado de alma.

beijo, poeta amiga!

Enigmático Byjotan disse...

Dolorido,penoso,real e forte como a dor de quem a vive.Beijo entusiasmado do leitor.:-BYJOTAN.